Memórias de Felinto Paulo de Oliveira Vasconcellos

Novembro, 11, domingo, 1956

Resolvi neste dia  começar este diário. Estava com 20 anos vividos sempre voltados para o bem e para Deus, e apesar das inúmeras quedas sofridas, naquele momento tinha a vontade de ser bom.

 

                                                           ANTECEDENTES

 

Meu pai JOSÉ DE ASSIS VASCONCELLOS (Zeca) nasceu no dia 14/09/1886, em Anajaz, na Ilha de Marajó, Estado do Pará (faleceu em 04/03/1954, no Rio). Ele era filho de ANTONIO DE ASSIS VASCONCELLOS (faleceu em 22/03/1922 em Fortaleza) e RAYMUNDA GREGORIA DE SOUZA VASCONCELLOS. Seu avô paterno foi JOSÉ CALIXTO SILVEIRA DE VASCONCELLOS, nascido em 1833, em Massapé, no Ceará e falecido em 1908. Sua avó paterna foi FRANCISCA BALBINA ARAUJO DE VASCONCELLOS, nascida em 16/02/1835. Minha mãe UMBELINA DE OLIVEIRA VASCONCELLOS (Bila) nasceu no dia 21/08/1893, no Rio Grande do Norte (faleceu no Rio em 26/02/1973). Ela era filha de FELINTO ALVES DE OLIVEIRA (faleceu em 1906) e MARIA AMÉLIA DE OLIVEIRA (faleceu em 1934). Seu avô materno foi JOSÉ ANTONIO DE OLIVEIRA (português da cidade do Porto). Sua avó materna foi MARIA AMÉLIA CARRILHO DE OLIVEIRA.

Em 1918, Bila e Zeca foram para o Rio de Janeiro. Moraram no bairro do Rocha, com a Anna, irmã do Zeca (chamada de tia Neném), onde nasceu a minha irmã Risoleta. Devido ao surto de gripe espanhola, foram morar em Santa Tereza, com a avó Amélia. Mudaram-se depois para a rua Itapiru, onde nasceu a Heloiza (1923); depois foram morar à Travessa Navarro, onde nasceram José Maria (1927) e Luiz Carlos (1929). Em seguida passaram à rua Campos da Paz, onde nasceu a Maria José (1930) e depois moraram à rua Santa Alexandrina, onde nasceu a Maria Helena (1932). Moraram depois à rua Santo Afonso, 66, que foi comprada por 40 contos de réis, com pagamento de oito contos de réis de entrada e lá ocorreu o casamento da Violeta com o Oscar. A casa da rua Desembargador Isidro, 46 foi comprada por 120 contos de réis e lá nasceram o Felippe em 1934 e eu em 1936.

 

 

1936 – 1937 – 1938- 1939 – 1940 – 1941

 (Nesta foto apareço no colo da minha madrinha e irmã Violeta, ao lado do papai. Aparecem também o mano José Maria, o mano Felippe sentado e a minha irmã Maria José. Dá para ver o Affonso querendo colocar a mãozinha na minha testa)

 

Nasci às 21horas do dia 3 de junho de 1936 na casa da rua Desembargador Isidro, 46, no bairro da Tijuca, no Rio de janeiro, uma quarta-feira, mas meu pai me registrou como nascido no dia 4. Fui batizado no dia 4, quinta-feira, na igreja de Santana e meus padrinhos foram o meu primo e cunhado Oscar (17/01/1912 – 16/06/1980} e a minha irmã Violeta (27/09/1914 – 19/03/1937). Dessa época de nada me lembro. Muito agradecido sou aos meus queridos pais e parentes pelo cuidado que me dispensaram. Sei que estive muito doente, que quase morri. Nesse ano de 1936 ainda andei nos braços da minha irmã mais velha e madrinha que perderia no ano seguinte. A morte dela foi assim relatada pela minha irmã Heloísa: “A Violeta havia tido a Anna (20/12/1936 - 02/09/2003) e estava fraca. A tia Izaura que morava em São Paulo, convidou-a para passar uns dias lá, até que a casa dos fundos que estava sendo construída, ficasse pronta e que levasse a Raymunda (15/02/1912 – 07/04/1990), nossa irmã de criação. A Heloisa (24/10/1923) ajudou a vestir o Affonso (02/08/1935) que tinha só 1 ano e meio. A Raymunda estava de azul. Uma velhinha amiga da Violeta , que levava biscoitos para o Affonso, a quem chamava de Menino Jesus, gritava para ela não ir. Pegaram o trem às 7 horas. Após uma semana, a Violeta enviou uma carta dizendo que estava bem. Na outra semana já dizia que sentia uma dor de  cabeça. A mamãe recebeu um telefonema do tio Alfredo e exclamou: “Mal sinal!”. O papai, a mamãe e o meu primo médico Edgard (faleceu em 12/04/1977) foram para São Paulo. Colocaram a Violeta em uma padiola e voltaram no trem Cruzeiro do Sul. Foi de ambulância para a casa da rua Desembargador Izidro 46 e ficou no quarto do meio. Criança não entrava para não pegar a doença denominada tifo. A minha irmã Maria José (27/12/1930) entrou uma vez e a Violeta exclamou:Maria José!”. A Heloísa subiu em um guarda-roupa que separava do quarto da frente e viu a Violeta pedindo comida para a mamãe, que dizia que só podia dar canja. Ela gostava de comer muito. Ela foi emagrecendo até morrer. Só quem tomava conta dela era a mamãe e a tia Arthemira . Para poder trazer de trem o papai enganou a fiscalização dizendo que ela tinha apendicite e não tifo. Em 1938, foram as bodas de prata dos meus pais (Casaram em 06/12/1913). Em um filme apareço vestido de branco. No dia 8 de dezembro de 1941, com 5 anos, fiz a minha primeira comunhão junto com o meu irmão Felippe (13/09/1934). Depois tiramos retrato  em um fotógrafo na Praça da Bandeira. Fomos de táxi com a nossa mãe.

 

Lembro-me das aulas de catecismo em que desenhávamos e pintávamos as passagens bíblicas. Ainda hoje reconheço uma das minhas professoras. Das outras eu me esqueci. Tirei retratos com o meu padrinho Padre Augusto, vestido de príncipe.

 

 

1942- Fui freqüentar o Colégio Dom Vital, na mesma calçada da minha casa na rua Desembargador Izidro. No primeiro dia de aula eu fugi do colégio. Em casa  porém estava o meu velho pai doente com aquela sua suéter marrom, que puxando do seu cinto me fez voltar. Hoje agradeço tal decisão. O nome da diretora do colégio era Zélia, do diretor Otacílio e tinham dois filhos colegas nossos: Otacílio e Aníbal Augusto.

1943- Passei para o 1º ano primário. Era o segundo aluno. Em primeiro lugar estava a Maria Anita, uma menina lourinha. Um outro colega Ivan, morava na rua em frente à minha casa, rua Barão de Pirassununga. Numa casa bonita em frente do colégio, de esquina (hoje um posto de combustível) morava uma colega que desenhava muito bem. Seu nome não sei se é Estevão ou Cristóvão.  Lembro-me dos nomes das professoras: Lourdes e Egelzira.

1944 – Lembro-me das audições do repórter Esso em que todos ficávamos atentos ao ouvir os lances da Segunda Grande Guerra.

1945 – Fui à cidade de São Lourenço, em Minas Gerais com a mamãe e tia Arthemira. Lembro-me que o trem com locomotiva a vapor passou por 11 túneis e que ficava abafado com fumaça ao passarmos por dentro deles. Em São Lourenço ficava a ouvir futebol pelo rádio com o Arizinho, neto da tia Amélia. Colocávamos besouro nas costas das pessoas que passavam nas calçadas. Passeamos a cavalo, de gaivota. Bebi água mineral.Passeei de charrete. Gostei muito. Os irmãos em casa acharam que eu era privilegiado por ser o caçula.

 

 

Aos domingos o papai me levava às matinées no cinema América, na Praça Saenz Pena. Gostava muito de ver as séries sobre o Homem Voador e uma outra em que o inimigo se tornava invisível com um medalhão no peito. No Natal ganhei uma charrete. Papai era sócio do meu tio Françú, em uma loja de brinquedos na rua Senhor dos Passos. Gostava muito das férias na ilha de Paquetá.  O papai sempre alugava uma casa. A mamãe era contra comprar porque tinha medo que um dia o mar cobrisse a ilha. O papai trabalhava muito. Só ia no final de semana. Só andava de bonde. Ele brincava de ficar debaixo d’água sem respirar. Achava o papai mais forte de todos. Ele era muito bom! Como eu tinha medo de mascarado no Carnaval, uma vez ele quase joga um dentro d’água para me tirar o medo. A Raymunda fazia gostosos sucos de uva. Lembro-me dos fogos de São João que o primo Edgard soltava. Das gorgetas que nos dava. Dos barcos que o Oscar fazia no Arsenal de Guerra do Caju.. De como a casa ficava cheia e dormia em esteira. Das bicicletas que alugava na conta do “Seu Zéca”. Acordava, tomava café, ia para praia, de bicicleta dava a volta na ilha com medo dos cachorros levantava as pernas quando eles atacavam, comia cocada e andava de barco. Uma vez fui salvo pelas minhas irmãs quando pulei em um lugar que achava que dava pé, mas a maré havia subido. Dizia que ia ser padre igual ao meu irmão mais velho José Maria.