* * * RADIOAMADORISMO * * *



JOSÉ OLÍMPIO ANDREATTA CAVALLIN - PY5AY

A ANTENA GIGANTE


           Era uma noite gélida, no inverno de 1981. Na cabeça de dois "geniais" colegas curitibanos - ambos beirando os vinte anos de idade e já com um bom tempo de rádio - fervilhava uma idéia: utilizar uma gigantesca antena em um concurso internacional e, assim, conseguir uma performance inigualável...!

           Por não poderem construir tal artefato faraônico, pensaram em servir-se de um sistema irradiante já pronto, ou seja, a antena de uma emissora de ondas médias, cuja torre media mais de oitenta metros de altura, com radiais de cento e vinte metros de extensão. Resumindo: era a antena da antiga Rádio Estadual do Paraná, hoje Educativa AM.

           Já no início da fatídica noite, lá se foram os dois destemidos amadores para a casa dos transmissores da emissora estatal, onde residia e trabalhava outro radioamador e amigo, sem cuja cumplicidade tal façanha jamais teria acontecido.

           Depois de acomodados entre sanduíches, café e outras mordomias feitas pela esposa do colega anfitrião (PY5TT - Gerson, já falecido), os rapazes ligaram os equipamentos para lá transportados. Ansiosos, aguardavam o fim das transmissões da rádio, à meia-noite, para conectarem seu transceptor na "prodigiosa" antena...

           Zero hora, sai do ar a Educativa... Rápidos, nossos ingênuos aventureiros se engalfinham com cabos e conexões, tentando concretizar o tão esperado casamento entre seu rádio e a monstruosa antena...

           Quase uma hora depois, extenuados e abatidos, entregam os pontos...: o acoplamento1 não aconteceu, por absoluta incompatibilidade entre as partes do que deveria ter sido uma poderosíssima estação, arrebatadora de concursos internacionais. Mas, valeu!... Melhor sorte, com a próxima idéia...!

           1 - Acoplamento é o processo pelo qual se otimiza um sistema irradiante (antena), em relação a um transmissor (N. do A.).

QTC DE FALECIMENTO

           Entre as tarefas mais desagradáveis que o radioamador assume, está a passagem de notícias tristes; como as de morte, por exemplo. São muitos os casos, principalmente em cidades isoladas, de famílias que precisam avisar parentes ou amigos, do desaparecimento de algum ente querido.

           Apesar de terem sido mais freqüentes nos tempos em que o telefone era luxo, ainda ocorrem casos desse tipo. Contam-se histórias que, se não fossem trágicas, seriam cômicas...

           A primeira, aconteceu numa base nordestina da Força Aérea Brasileira, nos anos 70, protagonizada por um sargento. Certo dia, estando ele de serviço, chega pelo rádio o QTC (recado/notícia) do falecimento do Comandante daquela base, num sinistrado vôo pelo sul do País.

           Era preciso informar a esposa do tal coronel-aviador, residente na vila militar anexa à base. Apressado e nervoso, lá se foi o pobre sargento com a má notícia.

           Chegando à casa do coronel, respirou fundo, tomou coragem e disparou esta "pérola", na mulher que o atendeu à porta: "- Bom dia... A senhora que é a viúva do coronel...?" (!!!).

           Esta outra aconteceu na cidade de São Paulo, faz uns trinta anos, numa chuvosa noite de verão. Era já bem tarde e certo radioamador acabava de receber um típico "torpedo", de outro colega do interior: devia ir até a periferia, avisar do desenlace aos familiares de certo defunto.

           Decidido e sem demora, nosso compadecido colega paulistano (hoje também de saudosa memória) embarcou em seu carro e saiu à procura do distante endereço da família do "de cujus".

           Muitos quilômetros, lama e enganos depois, quando já quase amanhecia, finalmente ele achou a tal casa.

           Na varanda, encharcado até a alma, recebeu a seguinte recompensa, da enfurecida dona do casarão: "-

           É, morreu, é...?!... Pois o senhor já é o quarto engraçadinho que me acorda esta noite, pra me avisar...!!" (!!!).

           Fica a lição: nunca se sabe quantos 'bons samaritanos' estão à escuta...!

CIRANDA DE EQUIPAMENTOS

           É comum e muito recomendável, principalmente nos países em desenvolvimento, que os radioamadores mais privilegiados financeiramente se encarreguem de importar equipamentos de última geração e, depois de algum tempo de uso, que eles passem adiante essas cobiçadas engenhocas para algum sortudo colega.

           Mas, mesmo quando o tal rádio não é alguma maravilha tecnológica, existe sempre alguém interessado em abiscoitá-lo; a fim de que se reedite a já tradicional sucessão de posse dessas e de outras estações.

           Assim, contam-se mil façanhas de rádios mirabolantes, que conseguiram "sobreviver" a diversos proprietários, suportando até aguerridas disputas; não só entre colegas de radioamadores falecidos, mas também entre viúvas e herdeiros ciumentos de cobiçados espólios eletrônicos...!

           Não são raros os casos de transceptores que se tornam alvo de verdadeiro culto, por parte de entusiastas dessa ou daquela qualidade, devido a uma inexplicável fama espalhada, muitas vezes, por operadores fanáticos por novidades. No fundo, eles nem sempre sabem direito como funcionam aqueles circuitos complicados...!

           O fato é que, na prática, certos equipamentos realmente demonstram resistência e performance à toda prova, sendo repassados inúmeras vezes e prestando ótimos serviços a sucessivas gerações de amadores.

           Existem rádios fabricados há mais de quarenta anos que, apesar de terem sofrido reparos e adaptações, ainda proporcionam grandes alegrias a quem os opera.

           Fala-se até de uma espécie de "relação" entre o radioamador e seu equipamento, chegando a ocorrer casos trágicos de "traição" e "divórcios" mal-resolvidos... E a parte que mais sofre é sempre o ex-dono da máquina.

           O que se espera, porém, é que jamais se perca o espírito de partilha entre os praticantes do radioamadorismo. Para que se verifique, também na prática, a fraternidade tão decantada!

Colaboração de Ivan Dorneles Rodrigues - PY3IDR
e-mail: ivanr@cpovo.net  


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Publicado em 25 de junho de 2006
Atualizado em 25 de junho de 2006